aqui há gato!
é tão óbvio
que salta à vista
o gato não
a sabedoria
do gato
é acordar palavras
adormecidas
só para dizer
aqui…
aqui há gato
são todos e são um só
mais não havia
que se houvera
mais haveria
a uma voz
respondem
não importa qual
todos a seguem
porque lhe reconhecem
a justeza do mando
ser pescador
é trabalhar em rede
há, porém, buracos ainda
a remendar
ou não fossem homens
que da perfeição
nada sabem
senão o trabalho
de a tentar
(ria de aveiro;torreira; marina dos pescadores)
a tristeza chega
súbito
é chuva no rosto
escorrendo
amarguras
ausências
pouco basta para
somos tão frágeis
tão uns dos outros
a tristeza chega em abril
mas floresce
em qualquer mês
onde
uma ausência
se fez sentir
crescemos
que se cresce sempre
com homens como tu
que são nós
mesmo depois de
não há palavras
tristes
há tristeza
nas palavras
onde existes ainda
a roupa a secar algures
uma ida à horta
por umas couves
uma vida assim
entre a casa e a lavoura
com domingos de missa
procissões de santos
um copo na mesa
e o homem
à espera
os filhos criados
os netos com eles
longe
que aqui não
pelas ruas da aldeia
mais que o alguidar
carrega os anos
que por aqui anda
(não sei se ainda)
há dias de festas
de feiras
(de compras em conta)
de vendedores à porta
que ainda fiam
e confiam
há gente assim
aqui:
é o meu povo
em abril a 25
voámos de novo
numa madrugada clara
libertos de vendas
grilhetas e guerras
sonhámos um país novo
um país puro e limpo
feito de manhãs eternas
quisemos a utopia
guardada tantos anos
nos baús de acesso restrito
voámos
demos as mãos
mais que amigos
dissemos: irmãos
corremos
chorámos
beijámos
dissemos:
a paz
o pão
habitação
continuamos
porque ainda se não cumpriu
aquilo com que sonhámos
em abril a 25
queria-te dizer
fernando
a ti que tantos foste
que isto de uma pessoa
andar para aqui a escrever
num país de poetas
não é fácil
que ele
há palavras, há
encontrá-las é que é o diabo
fazer delas um poema
é um drama
e não é
porque afinal
não é poema
é isto
uma imagem
a tua
umas palavras
minhas
e o vício
sim o vício
de dizer coisas
mesmo sem sentido
como estas
esquece
daqui a uns tempos
ninguém se lembrará de mim
nem sequer do monólogo
que tive contigo
já de mármore em oeiras
a do isaltino
ele sim
lembrado pela sua grande obra
e um humilde taxista
algures