a #caçadeira, a carrinha funerária e o dr. google


(a minha crónica de dezembro no “Notícias de Aveiro”)

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manuel pego na sua #caçadeira a remar à ré – década de 90

No dia 13 de Maio de 2018, o Cais do Bico, na Murtosa, foi palco de um momento marco na história dos moliceiros tradicionais, o bota-abaixo do moliceiro Ferreira Nunes. Infelizmente pelo que vos contarei a seguir é também um dia triste e que servirá de alerta para o futuro.

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manuel pego a levar a #caçadeira à vara – década de 90

A bateira mais pequena da ria de Aveiro é a #Caçadeira que, como a própria designação indica, era uma bateira usada para a caça e algumas artes de pesca solitárias. #Caçadeira sem qualquer outra designação acessória.

Entre os muitos mestres construtores, destacaram-se na construção da #Caçadeira, Joaquim Rato e Preguiça. Foi uma #Caçadeira construída pelo mestre Joaquim Rato – talvez a última em bom estado de conservação – que fotografei e medi, num armazém propriedade de familiares do mestre.

Comprimento– 4,5 metros ; Pontal – 0,30 m; Boca – 1,10m; Cavernas: 8

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a #caçadeira feita pelo mestre joaquim rato

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versão da #caçadeira a preto e branco

Como se pode ver era uma bateira muito pequena, normalmente só para uma pessoa, sem leme, nem traste e o mastro entrava num buraco existente no vertente. Era um barco muito leve, embreado e que o tripulante, normalmente caçador, podia facilmente transportar para seco e abrigar-se num coberto de junco ou canizia na espera da madrugada e da caça. Nos meus tempos de jovem cheguei a andar numa. Era a bateira que os emigrantes tinham para, no seu regresso temporário à Murtosa, fazerem as suas pescarias à fisga, à certela, ao candeio e grandes caçadas.

Nos meus arquivos encontrei uma foto, dos anos 90, de uma #Caçadeira, em frente ao Cais do Bico, já era só embreada por fora, tinha uma pintura alaranjada no interior. Ao mostrá-la ao balcão da Casa da Alcina, na Bestida, logo um companheiro, Carlos Litro, a identificou: era de Manuel Pego, funcionário da Auto-Viação da Murtosa, e nela o Carlos tinha feito muitas pescarias.

Ora no citado dia 13 de Maio, aconteceu também o bota-abaixo de uma bateira de recreio, a que deram o nome de “Menina da Ria”, com o comprimento de uma #Caçadeira, nada mais. Pintada de azul, amarelo, vermelho, branco e mais cores houvera, com leme, traste e mastro a entrar no “buraco do traste”. Só teria, repito, da #Caçadeira, sem o medir, o comprimento.

Logo ali foi identificada pela proprietária e pelo Presidente da Câmara da Murtosa como sendo uma “bateira caçadeira”. Ao Presidente da Câmara perdoa-se-lhe o não saber o que dizia, basta olhar para o logotipo que adoptou para o Município, o mesmo não se poderá dizer da sua proprietária que se diz estudiosa e defensora das embarcações tradicionais da Ria de Aveiro. Não me manifestei na altura atendendo à presença de amigos que tinham vindo de longe para assistir ao bota-abaixo do moliceiro. No entanto, perguntei a alguns murtoseiros, mais velhos que eu, se “aquilo” era uma #Caçadeira. A resposta imediata foi que não. Quem é que ia à caça com uma bateira colorida? Para cores havia as negaças.

Do bota-abaixo da dita bateira de recreio se fez divulgação e foi notícia, espalhando-se a falsa designação, associada a uma ainda mais falsa reprodução.

Imaginem a seguinte história. Um casal de jovens compra uma carrinha funerária em bom estado, pinta-a de cor de rosa, decora-a com corações vermelhos e adapta-a para caravana. Toda colorida, artilhada e preparada para passear, alguma vez alguém lhe chamaria carrinha funerária? Jamais! Era uma caravana para passeio.

É ridículo o exemplo? E o que fizeram à #Caçadeira? Pintam-na, fazem adaptações, chamam-lhe bateira-caçadeira, e são abençoados pelas entidades da terra.

Pior, se fizerem uma busca na internet usando o Dr. Google e escreverem “caçadeira” só vos aparecem armas, se escreverem “bateira caçadeira” vejam o que aparece. E assim o erro, que nos meios de comunicação tradicionais demorava anos a espalhar-se, hoje com a comunicação digital, reproduz-se a uma velocidade inimaginável.

A #Caçadeira, a mais pequena bateira da ria, tem de voltar a figurar de novo nas pesquisas do Dr. Google. Porque estou a escrever num jornal digital e a notícia vai ser reproduzida em publicações nas redes sociais, coloquei sempre o “hashtag” #, antes de Caçadeira. Facilita o encontrar da designação correcta associada a este conteúdo.

Podem perguntar porque esperei até agora para fazer esta publicação. Esperei muito, é verdade, mas tinha de investigar e testar aquilo que aqui afirmo, consolidar pesquisas. Este é o tempo.

Assim termina um ano de colaboração mensal no Notícias de Aveiro onde tive a liberdade de me expressar e desmontar algumas falsas verdades, que nunca foram desmentidas nem referidas pelos que as vão espalhando por aí.

Regresso em 2019, quando e com o que de interessante me parecer merecer escrita. Eu, como me conheço nesta fase da minha vida: sem outros compromissos para além dos impostos pelos médicos e por aquilo que me dá prazer fazer, quando me apetece fazê-lo.

Peço-vos que façam de 2019 o ano da #Caçadeira e da recuperação da sua memória, da verdadeira e não da que nos impingiram em 2018. Divulguem este artigo e as fotos.

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postal com uma #caçadeira, da colecção de paulo horta carinha (1926)

Bom ano.

(nota: o facto de no artigo eu usar maiúsculas tem a ver com a natureza da publicação, excepção feita a #Caçadeira que foi propositado)

a crónica no “Notícias de Aveiro”

A #Caçadeira, a carrinha funerária e o Dr. Google

 

 

postais da ria (198)


notas de um retirante

o associativismo dos pescadores no concelho da murtosa

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o fernando bastos a cirandar, na bateira a esposa, vivelinda bastos

no livro “Breve História do Concelho da Murtosa” da autoria de Marco Pereira, houve o cuidado de fazer o levantamento do movimento associativo do concelho, listando por tipologia as diferentes associações existentes ou que tiveram existência. no que respeita a associações de natureza económica, não encontramos nenhuma referente ao sector das pescas.

de acordo com documentação que enviei ao autor foi, no entanto, fundada em 1921 a “A Associação de Classe dos Marítimos da Murtosa”, de que, entre outros, foi sócio fundador o meu bisavô Domingos José Cravo.

segundo documento da “Secção Administrativa e Policial de Estarreja” de 1937, informa-se o Governo Civil de Aveiro “que não há elementos que possam esclarecer como e quando acabaram as Associações dos “Marítimos da Murtosa” e …..”.

ou seja, foi sol de pouca dura.

seria interessante, em estudos futuros abordar o associativismo dos pescadores do concelho.

dou como exemplo o que se passa na torreira, onde se concentra a maior comunidade piscatória : os pescadores são representados, na sua maioria, por uma associação com sede em viana do castelo e por uma outra associação com sede em aveiro. a concessão da docapesca da torreira, foi ganha pela associação de aveiro.

se considerarmos que os pescadores descontam 1% para a associação que os representa e mais 1% para o concessionário da docapesca, talvez cheguemos a números interessantes.

tentei sabê-los mas …. até hoje nada.

porque é que o associativismo local não vinga entre os pescadores do concelho e vão buscá-lo fora?

mais que uma pergunta, fica um desafio para quem se dedica ao estudo das comunidades piscatórias.
(cirandar berbigão)

postais da ria (98)


regata de chinchorros

laurindo, alfredo miranda e o filho do domingos da grila

jim, alfredo miranda e o filho do domingos da grila

de todas as regatas que se fazem na ria, já o escrevi algures, a mais espectacular é a dos chinchorros a remos.

este ano concorreram 13 e a classificação final foi a seguinte:

1ª – Marisa e André (bicampeões)

2ª Sta Maria Adelaide

3ª Raquel

muito difícil de fotografar. de terra só a chegada ou eventuais treinos e na ria, pela rapidez com que tudo se desenrola e pela disposição das bateiras – paralelas entre si – e o consequente posicionamento do barco onde vamos.

este ano, ficámos a sul da bateira, mais a sul, a “Raquel”. a minha técnica é escolher uma bateira e fixar-me nela, por momentos posso mudar, mas mantenho-me fixo numa.

este ano, escolhi a “Raquel” e experimentei registar algumas expressões de remadores.

este foi um dos registos possíveis.

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(torreira; corrida de chinchorros; s. paio; 2015)