um dia disse-lhe
agostinho quando eu morrer as minhas cinzas vão para o mar
e o agostinho
ah cravo nesse dia não vou ao mar
ele partiu primeiro
(era o meu melhor amigo)
(torreira; 2013)
um dia disse-lhe
agostinho quando eu morrer as minhas cinzas vão para o mar
e o agostinho
ah cravo nesse dia não vou ao mar
ele partiu primeiro
(era o meu melhor amigo)
(torreira; 2013)
“são todos uns insurrectos, cravo!”
só ele sabia dizer esta frase que passou a ser minha saudação provocatória: “você é um insurrecto, ti abílio!”
se existe a “brejeirice da beira ria” como forma de expressão, era no ti abílio que ela encarnava, na malandrice , no sorriso, na ingenuidade sábia, no ser amigo.
o ano passado falei com ele duas vezes pelo telefone, uma das vezes liguei-lhe eu a dar-lhe os parabéns, como era costume, a outra foi ele que me ligou e me deixou preocupado e triste. o ti abílio tinha vendido o moliceiro “Dos Netos” porque já não se sentia em condições de navegar e ao telefone disse-me mais ou menos isto:
havia dois moliceiros de velha cepa na murtosa: o ti zé rebeço e o ti abílio carteirista. mas bastava dizer “ti zé” ou “ti abílio” e todos sabíamos, sabemos, quem eram.
ambos morreram
ambos estão vivos, o ti zé e o ti abílio são para sempre
morreu tanta memória com eles, só não pode morrer o dever que temos para com a sua memória: continuar com a tradição dos moliceiros – os verdadeiros, com vela.
o ti abílio morreu ontem dia 10 de janeiro de 2024
(torreira; regata da ria; 2017)
(pescador de ovar; torreira; 2006)
no voar da gaivota o mar aprende o vento
(zé pato; 1973 – 03/03/2023)
(praia de mira; 2008)
(eira pedrinha; s/d)
(torreira; 2008)
(praia de mira; 2008)
(torreira; 2014)
(cae; figueira da foz; 2019)