cabrita baixa ou dança da ria


 

na placidez das águas

caminham

arrastam mais que o corpo

o peso do pão

 

cerram os dentes

apertam os punhos

sofrem

muito

 

porém

dançam

dizes tu que vês

e não entendes

 

do fundo da ria

vêm os bivalves

do fundo das gentes

forças desconhecidas já

é tempo de safar o ano

 

dirás que dançam

dir-te-ei que esta é outra

forma de sobreviver

 

—————

 

sobre este tema foi elaborado o seguinte projecto:

– uma descrição da arte: aparelho e modo de proceder

– um fotofilme genérico

– 6 documentários de pormenor

———–

descritivo:

a arte da cabrita baixa é utilizada para a apanha de bivalves (neste caso amêijoa japónica) de modo apeado. nela participam homens, mulheres e adolescentes.

a apanha faz-se na vazante, logo que haja calado para trabalhar, até que o mesmo se perca, já na enchente.

o aparelho é constituído por:

– haste: em eucalipto de cerca de 2 metros
– cabrita: semi-circunferência em ferro, em média com 30 dentes de 6 cm
– redenho: com malha de 35mm e comprimento variável, de 1m a 1,5m
– bóia: presa no topo do redenho
– tirante: normalmente em rede de nylon grossa, ata à cintura e prende na base da haste, é nele que grande parte do esforço assenta.
– peso: cilindro de aço ou ferro, de 5kg a 10 kg, fixado na base da haste, junto à cabrita

(peso total do aparelho: 10 a 15 kg)

acessório

vara de apalpar: com altura variável (normalmente um pouco mais de 2 metros), serve para o pescador ir vendo altura da água e comparar com a sua, ficando assim a saber, no caso de decidir iniciar a faina “por onde lhe irá dar a água”.

o cabritar:

a cabrita é atirada à ria e com o peso que tem enterra-se no fundo, depois é arrastada com movimentos de cintura enquanto os braços a mantêm o mais fundo possível.

podemos distinguir os seguintes momentos na faina:

– arrastar
– ver e lavar o redenho na ria
– levar a cabrita até à bateira, se tiver apanhado o suficiente
– deitar a cabrita na bateira, com o redenho na água
– fazer a última lavagem de limpeza na ria
– descarregar o redenho na bateira

é uma arte muito dura e que provoca problemas nos músculos dos braços – no cotovelo formam-se bolas de músculo,

muito dolorosas.

————-

fotofilme: cabrita baixa, torreira 2012

————-

documentário 1:  vara de apalpar, cabritar

———

documentário 2:  cabritar e cirandar a bordo

————–

documentário 3: lavar e descarregar o redenho no barco

————

documentário 4:  o tirante

—————–

documentário 5:  as mulheres

————–

documentário 6: a dança do cabritar

cabrita alta_o documentário


joão manuel brandão

limpo de todos
os artifícios
o homem surge
dos confins de si mesmo
no resgate do pão

entre o esgar de dor
e o sorriso
ele existe
no abraço da vida
no silêncio da ria

pisa a fronteira
de si

———————

com o documentário

;