Companheira da vida desde o primeiro momento, a morte aguarda serenamente a sua vez. Não será então justo que qualquer ser tenha direito a uma boa morte?
Não há ideologias ou religiões, que possam ser contra este direito, pelo contrário todos o devem defender.
Nas mortes por enforcamento, quem podia pagava ao carrasco para que a morte fosse rápida, por fractura da cervical e não por asfixia prolongada e dolorosa.
Os regimes ditatoriais preocupam-se sempre com a morte do opositor, procuram proporcionar-lhe o maior sofrimento possível, durante o máximo tempo – as torturas com interrupção ordenada pelo médico assistente. A morte virá como consequência.
Na guerra há mortes para todos os gostos, mas a suprema sofisticação está nas as bombas de fragmentação com projécteis não detectáveis pelos raios X (usadas no Vietname, por exemplo) e que provocam sofrimento permanente na vítima. São exemplos que ainda hoje são factos.
Inesgotável a imaginação dos sádicos na invenção de métodos que, mais que a morte, provocassem sofrimento.
Boa Morte, numa só palavra EUTANÁSIA – do grego “eu” → bem e “thanatos” → morte.
E é esta palavra que divide, assusta, provoca manifestações antagónicas: contra e a favor. Como se alguém pudesse ser a favor de uma MÁ MORTE.
Se defendemos o parto sem dor, porque não haveremos de defender a BOA MORTE – a morte sem dor?
Não compete ao Estado decidir sobre a morte de alguém – Portugal pode vangloriar-se de ter sido o primeiro país a abolir a pena de morte –, mas não pode o Estado impedir que um cidadão, com diagnóstico de morte inevitável, tenha de sofrer até ao último momento, só porque há uma lei que o impede de dizer “chega, não aguento mais!”.
Garantir que, tomada a decisão, o Estado assegura ao cidadão todos os meios para que “parta sem dor”, é o mínimo que alguém bem formado deve exigir.
É isso que irá a votação na próxima terça-feira, dia 29 de Maio. Permitir que seja o cidadão a escolher se morrerá em sofrimento ou antecipar o momento da partida por ser insuportável continuar a viver.
Antes de pensar seja no que for, pense primeiro que é um familiar seu que, na sua presença, pede para morrer; em seguida pense que pode ser você.
O que lhe diz a sua consciência?
A tua clareza de pensamento, neste dia em que assisto pela televisão à discussão dos projetos de legalização da eutanásia, faz-me declarar que sou pela despenalização, já pelo meu percurso, já pela experiência de vida, já pelo respeito pela pessoa humana.
Um abraço da Isabel Amorim
Não duvido sobre a bondade da proposta. Como dizes, é também uma questão de liberdade pessoal. Pelo facto de alguém poder decidir pela eutanásia não significa que se torne uma obrigação, Portanto, de que ter medo?
Ana Valente Uma das coisas que sempre me pareceram essenciais para que um ser humano possa viver com dignidade, é a LIBERDADE. Liberdade de decidir, de escolher. A matéria aqui trazida à colação é extremamente sensível e delicada. Razão acrescida para que a solução que preserve a possibilidade de livre decisão deva ser a escolhida. Como já alguém aqui referiu antes de mim, dar a possibilidade de escolha, abrir a porta à decisão consciente de cada um, não é obrigar quem quer que seja a optar por uma ou outra via. Já o seu contrário é claramente coartar a possibilidade de seguir por um dos caminhos. Criem-se formas de fornecer informação clara e objectiva sobre cada um dos caminhos, e dê-se a cada um a possibilidade de fazer a sua escolha. Eu exijo isso para mim. Se algum dia me deparar com essa situação, exijo decidir se quero ou não acabar com o meu sofrimento. E se o exijo para mim, exijo-o para todos. Isso também é exercer liberdade.