as quatro estações (III)


serra da gralheira, o que resta?

 

é outono

vê como os campos são mais frios

e mais castanhos meus olhos

e as árvores

folha a folha me dispo

a ti chego despojado de todas

as minhas máscaras

nas águas límpidas

dos primeiros regatos

das primeiras chuvas

refresco os lábios

todo o meu corpo treme

na antevisão da lareira

ao fogo o amor

é outono

nem só o verão é ardor

em louvor das serras


(resta-me crescer para a terra)

pedregulhos imensos borbulhas disformes
cobrem a terra a água nasce gelada para a
minha sede nuvens raras brincam estranhos
jogos selvagem meio rude paisagem é noite

as trutas aguardam a hora de beijar no espelho
da lagoa as migalhas ancestralmente os homens
juntam-se em torno do fogo o fogo cerca a água
chamados nocturnos oiço a tenda pequena
junta-nos o chão duro magoa os corpos vivos

é manhã o corpo entrego à água
refrescando o cansaço para melhor morrer
então cresço para a terra 
só as serras crescem para o céu

(macieira; serra da gralheira; 2008)