traz

traz nas mãos a manhã para que o dia nasça onde nunca nasceu assim te espero
torreira; cirandar; 2011
por vezes leio jornais
cabrita de pé
sei que são muitos
sei que fazem desta arte
modo de vida uns
de sobrevivência outros
de opulência poucos
sei que são muitos
mas que cada um
é um não é todos
sequer muitos
quisera alguns
sei que não sei nada
mas oiço muito
leio um pouco
aprendo todos os dias
sei que nada sei
mas o que não sei
que não sei
é muito mais que
tudo o que sei
e assusto-me
com tanto
sei que eles sabem
sei que se queixam
sei que nada fazem
sei como são
eles também
e há quem saiba muito mais
eu?
eu só tiro fotografias
por vezes leio jornais
muito dura a arte da cabrita
(torreira; cabrita de pé)
o ti henrique cunha a cirandar
ainda há força nos braços
depois de horas
a arrastar a cabrita pelo lodo
a dança da cabrita
é violenta
o fruto é cada vez menos
abundam as conchas
onde antes bivalves
homens mulheres jovens
mais velhos
todos todos caminham
no lodo
parecendo ao longe
que sobre as águas
é tempo agora de cirandar
depois escolher
e no fim vender ao preço
que o comprador disser
o ti henrique cunha a cirandar
(torreira; junho; 2016)
é dura a solidão do pão
hoje saí à rua nu
enquanto caminhava
fui-me vestindo
com tudo o que via
cheguei a casa
com roupa nova
ajoelhado na lama um homem, ou uma mulher, busca na lama o sustento
(torreira; apanha de bivalves)