o meu lado

que se passará sob a superfície das
aguas?
escrevo de um país ao lado
de um povo sem casa
nem abrigo desempregado
ou mal pago doente
de não haver orçamento
e não saber o que isso é
escrevo de um país ao lado
de meninos mascarados de homem
mamando no biberão do tacho
cuspindo insultos sem pudor
sobre quem nada pode
escrevo de um país ao lado
marginalizado por ter sido sempre
o motor do barco e ser lançado
borda fora pelos passeantes de serviço
como se lastro a mais depois de usado
cansa-me esta gentinha de gravata
fato pendurado no corpo
passeando o arroto em alta cilindrada
pelas avenidas da minha vergonha
escrevo de um país ao lado
e sei qual é o meu lado

é preciso encher os olhos para tapar a boca
(ria de aveiro; regata da ria; 2010)
40.760681
-8.705260