está frio tenho os dedos gelados entanto ardo por dentro um fogo intenso que se consome no acto de escrever estas palavras poucas que nada dizem como sempre mas que me embrulham e me aconchegam nestas noites de estar só
mãos
os moliceiros têm vela (415)
enormes

torreira; regata da ria; 2020
enormes as mãos
destes homens
enormes estes homens
do tamanho de um barco
o moliceiro
mãos de mar (62)
sonho

torreira;2011
vazias mãos
apenas
de dedos cheias
esperam
assim este tempo
estes dias
ou o sonho
mudará o real
ou real
se tornará pesadelo
vazias ficaram
as mãos
é tempo de outro
tempo
mãos de mar (61)
recado

torreira; 2006
essenciais o pão
a sardinha
o copo de vinho
mar e terra
nas mãos do homem
essencial o ser
dono de si
estranhos serão
os tempos a vir
essencial o dar
as mãos
todas de todos
os moliceiros têm vela (389)
queria

torreira; 2015
queria dizer-te tanto
mas só no silencioso
linguajar dos dedos
te consigo falar de nós
mãos de mar (60)
areia

costa de lavos; aparelhar; 2019
escrever na areia
escrever com areia
fazer casa na areia
melhor ainda
aceitar que nada mais és que areia
um grão apenas
de areia
mãos de mar (59)
dos nós e das mãos

poderás saber
que mãos
desataram os nós
dos afectos
que os houve
cegos
bem apertados
resta o
terem sido
nada mais
que mãos
refarão os nós
desatados
entrega ao tempo
o saber
se saber houver
capaz de
(torreira; 2011)
mãos (3)
(lembrando dois grandes mestres
fernando pessoa e josé gomes ferreira)

querem
querem que eu tenha
o vosso tamanho
querem que desça
as escadas de mim
e fique na porta
de esperar sentado
estou aqui inteiro
com o tamanho de ser eu
não do sonho de mim
mas o de ser assim
queriam que eu tivesse
o vosso tamanho
deixem-me rir
(ao fundo um cantautor, senta-se ao piano e com a sua voz rouca inicia uma canção)
mãos de mar (58)
volto já

falo-te de um tempo
onde os dias se enroscam
preguiçosos e friorentos
sequiosos de sol
vai longe o verão
vão longe todos os verões
abraço-me e aqueço-me
sou a lágrima sustida nas cordas
dos cílios teimosos
amanhã quando acordar
ainda estarei constipado
nada que adoce a amargura
vou ver se roubo umas frases
bonitas e com elas fazer de conta
que sou o que gostava de ser
volto já
(torreira; o arribar do reçoeiro; 2016)
a beleza do sal (54)
da mão

flor de sal
a que dá
a que tira
a que ignora
a que acaricia
a que fere
a que mata
qual a tua?
(armazéns de lavos; 2017)