postais da ria (101)


haja uma pedra

toda a beleza num fragmento de tempo

toda a beleza num fragmento de tempo

é tarde para deixar de ser
os rios não voltam à nascente
nem me arrependo de ter nascido

sou o que cada dia descobre
o inesperado vindo do imprevisto
e não o somos todos?

na teia urdida por mãos hábeis
a arte é fazer crer que a vítima é outra
quando a aranha mata os pais

o mundo é cada vez mais dos répteis bífidos
fracos imitadores de animais sangue quente

haja uma pedra

sem elas a ria é um pântano

sem elas a ria é um pântano

(torreira; regata da bateiras à vela; s. paio; 2012)

crónicas da xávega (96)


escorro água e sal

o vento é de sul e levanta mar

o vento é de sul e levanta mar

desfaz-se a pedra em água
corre por entre os dedos areia
as paredes tremem e é de vento
o telhado onde antes casa

digo-te que não mereço
como não merecem aqueles
a quem nada resta senão
o serem como são por não
poderem ser de outro modo

voltaremos um dia e será manhã
até lá esperamos que o sol
se ponha devagar
e seja noite quando for

escrevo-te do exílio de mim
da memória de um tempo outro
que já não existe nem voltará

ao passado o que dele é
o futuro dir-se-á no tempo certo

o vento é de sul
o mar entrou no barco
escorro água e sal

eu fui ao mar

eu fui ao mar e o mar veio ter comigo

(torreira; companha do marco; 2015)

os moliceiros têm vela (146)


nada mais te resta

como se em bando

como se em bando

despede-te devagar
do sol

sustém os dias com mãos
ambas

colhe os frutos mais maduros
saboreia-os

guarda o paladar da ria
nada mais te resta

lembra-te da ria e da sua beleza

lembra-te da ria e da sua beleza

(torreira; regata do s. paio; 2015)

crónicas da xávega (95)


a mão de barca ao alador

o ricardo, a cacilda, o sílvio e no final o quim

o ricardo, a cacilda, o sílvio e no final o quim

quando o barco de mar arriba, traz com ele a “cala” – corda – chamada “mão de barca”, com a qual o fecho da xávega se fecha em terra.

o levar da extremidade da “mão de barca” até ao alador, tem de ser feito a força de braços, é um momento delicado porque a corda tem de se manter tensa e o esforço é enorme.

todos os que podem são necessários para este momento.

todos em esforço até ao alador

todos em esforço até ao alador

(torreira; companha do marco; 2014)

postais da ria (99)


eu só termino em mim

corrida dos chinchorros, os treinos

corrida dos chinchorros, os treinos

os primeiros passos
não os últimos
as primeiras palavras
a palavra o nome
o herdado

vi o que vias e procurava
outros olhares
mas era sempre o teu
o olhar recto

sou porque foste e me deste
serei porque assim te vi ser
não pelo que me dizes hoje

queria continuar a ouvir-te
mas eu só termino em mim

momentos para meditar

momentos para meditar

(torreira; corrida dos chinchorros; 2014)

os moliceiros têm vela (145)


vive e sonha

o equilíbrio natural da ria

o equilíbrio natural da ria

nada é tão certo
como a incerteza

sê tu no instante
em que a ave é barco
e os rios correm serenos
por entre margens largas

escuta o rumor do vento
a beleza dos flamingos

vive e sonha

o moliceiro "marco silva" desliza por um canal da ria, sob o olhar atento dos flamingos

o moliceiro “marco silva” desliza por um canal da ria, sob o olhar atento dos flamingos

(ria de aveiro; esteiros do bunheiro)

o

crónicas da xávega (94)


fico com os barcos

como se ave fora e voasse

como se ave fora e voasse

quando a faca corta a água
o sangue é incolor
como se o mar chorasse

despeço-me de ti
porque já não és
e eu que fui contigo
sou agora outro

fico com os barcos
reaprendo a navegar

navegar é preciso....

navegar é preciso….

(torreira; barco de mar maria de fátima; 2015)

postais da ria (98)


regata de chinchorros

laurindo, alfredo miranda e o filho do domingos da grila

jim, alfredo miranda e o filho do domingos da grila

de todas as regatas que se fazem na ria, já o escrevi algures, a mais espectacular é a dos chinchorros a remos.

este ano concorreram 13 e a classificação final foi a seguinte:

1ª – Marisa e André (bicampeões)

2ª Sta Maria Adelaide

3ª Raquel

muito difícil de fotografar. de terra só a chegada ou eventuais treinos e na ria, pela rapidez com que tudo se desenrola e pela disposição das bateiras – paralelas entre si – e o consequente posicionamento do barco onde vamos.

este ano, ficámos a sul da bateira, mais a sul, a “Raquel”. a minha técnica é escolher uma bateira e fixar-me nela, por momentos posso mudar, mas mantenho-me fixo numa.

este ano, escolhi a “Raquel” e experimentei registar algumas expressões de remadores.

este foi um dos registos possíveis.

ahcravo_DSC_1939

(torreira; corrida de chinchorros; s. paio; 2015)