lembras-te de quando nasceste?
nunca te lembrarás da tua morte
são estes, porém, os momentos mais importantes da tua vida
Dia: Julho 1, 2010
o nosso vizinho
nunca lhe soube o nome
era
“o nosso vizinho”
sempre em torno
das suas duas paixões e preocupações
o carro e
a esposa
era vê-lo
nas tarde soalheiras de inverno
capot aberto a dar de respirar ao motor
a sacudir os tapetes
a pôr o motor a trabalhar e
a andar dez escassos metros com o carro
era vê-los
sentados ao sol manso de inverno
abrigados do vento frio
pelas paredes de vidro e chapa do carro
ele a ler o jornal
ela a fazer renda
nunca lhe soube o nome
conheci-lhe porém um pouco da vida
( mais importante que o nome)
nas conversas parcas das horas mortas
do intervalo de almoço
gostava de os ver a descer a calçada
a caminho da bica
depois de almoço ou do jantar
se o tempo ajudava
nunca lhe soube o nome
mas nunca lhe esquecerei o rosto
a educação que já não se usa
o dobrar ligeiro,
sem ser servil,
da coluna, enquanto levava a mão à cabeça
para solevar o boné
o cumprimento sempre pronto
coisas de aldeia perdida na cidade
nunca lhe soube o nome
e agora
mesmo que o viesse a saber
já não poderia chamar por ele
será sempre
“o nosso vizinho”