os moliceiros à vela têm futuro?


duas gerações o mesmo sonho

duas gerações o mesmo sonho

o abraço que une o ti zé rebeço e o zé pedro, é a prova de que só não há futuro para os moliceiros com vela, se o não quiser quem manda nesta terra.

por experiência própria, sei que se a autarquia não quiser nada se faz. e eles sabem-no. foram eleitos pela esmagadora maioria dos murtoseiros, o que fizerem, ou não, é em nome dessa maioria e com o seu apoio, gostem ou não que eu o diga.

no passado foi o moliço, depois o moliço conviveu com as regatas. agora são as regatas e os passeios. e amanhã?

o zé pedro pode ser o futuro ou mais uma oportunidade perdida. com os poucos anos que tem, já é um arrais com provas dadas.

será que quem manda na terra não vê que ainda há jovens que sonham numa murtosa com moliceiros?

o ti zé rebeço e o zé pedro

o ti zé rebeço e o zé pedro

os moliceiros têm vela (71)


aos moliceiros

mete água? escoa!

mete água? escoa!

homens inteiros
até ao fim
a palavra na mão
que aperta

homens de fibra
feita na lide
dos dias de norte
terras muitas
escritas no corpo
sofridos dias

levarão com eles
mais que o corpo
a história da terra

água que entra tem de sair

água que entra tem de sair

(ria de aveiro; regata de ria; 2014)

os moliceiros têm vela (70)


maldigo os chulos

KONICA MINOLTA DIGITAL CAMERA

terem os homens
o tamanho dos barcos
unidos na mesma frema

falo da terra e uso
a sua linguagem
palavras inventadas
como tudo o que é
marca de lugar

indescritível o amor
indizível o sentir

olho-os e invejo neles
o serem assim
tão uns dos outros

maldigo os chulos

KONICA MINOLTA DIGITAL CAMERA

(murtosa; regata do bico; 2008)

postais da ria (70)


somos nós

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o meu país é gente
não uma geografia de sol mar
guardanapo no braço dobrado
mesmo se invisível
servil no serviço

o meu país tem muitos nomes
com título anteposto ou não
desempregados sem abrigo
ordenados em atraso
férias em paraísos longe
casas muitas cavalos bastos

o meu país é de carne e osso
para muitos mais osso que carne
para outros poucos só lombo

o meu país está velho e cansado
ou jovem e emigrado

o meu país são tantos
que dizê-lo numa só palavra
é não saber o que é

o meu país somos nós

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(ria de aveiro; torreira)

os moliceiros têm vela (68)


do sonho

a beleza do chegar

a beleza do chegar

espero dos dias
o serem um a um
o caminho para

desconheço quando
onde porquê

parte-se sempre
chega-se por vezes

abro a porta e deixo
o vento entrar

sou o que ficou
e aprendeu a sonhar

o pintar da ria

o pintar da ria

(murtosa; regata do bico; 2009)

os moliceiros têm vela (67)


do resistir

o ti abílio é timoneiro

o ti abílio é timoneiro

espectador de mim
desreconheço-me

haver um corpo
é haver eu
cada vez menos

são a descer os dias
naufrago neles
uma agonia sabida
não aceite

resisto

um dizer da murtosa: "a viola está nas mãos do zé ruivo"

um dizer da murtosa: “a viola está nas mãos do zé ruivo”

(ria de aveiro; regata da ria; 2013)

ao leme o ti abílio

os moliceiros têm vela (66)


da terra e das gentes

nem para mortalha, que tal não merecem

nem para mortalha, que tal não merecem

amortalhados serão os sonhos
na brancura de nada mais haver
que a memória

falarão dos dias havidos como se
tivesse de ser assim destino
fado português

ficam vozes perdidas no azul
aves de asas cortadas
um canto triste

tudo o que foi não será mais
não haver gente nesta terra
é ter ela o tamanho do seu
cemitério

que não descansem em paz

toda a beleza e é só pano

toda a beleza e é só pano

(torreira; regata da ria; 2014)