apresentação de “Faina” na praia da tocha


sábado às 17 horas no CIAX, na praia da tocha, irei apresentar “FAINA” , um livro cheio de mar e … tão bem escrito

venham e vamos conversar sobre literatura e arte-xávega

escreve Marta Pais Oliveira

Faina tem despertado leituras extremadas e isso agrada-me. O destaque da @gradivapublicacoes – que arrisca em novas vozes e formas de narrar e a quem agradeço muito essa crença – traz leituras positivas do livro e a nomeação como finalista do Prémio Literário Fundação Eça de Queirós.

Poderia fazer outro destaque com críticas de quem visceralmente não gostou do livro. Tenho reparado que é um texto que pode atrair ou repelir com intensidade.

Escrever é um labor de momentâneas fúrias e deleites e, na maior parte do tempo, continuada paciência. Encaro a leitura como um labor que constrói a outra metade do livro, encaro o leitor como um criador. Trata-se de um laço entre duas forças contra a incomunicabilidade.

Quando perguntam: escreves para quem? Em tempos trabalhei em publicidade com públicos-alvo. Nos livros – e por isso respiro – é o oposto. Escrevo para quem me quiser ler. Não escrevo para dificultar a vida do leitor, a construção frásica que me é natural é a que uso e não abdico do trabalho da linguagem. O que tento é criar textos com múltiplas camadas, como quem tira a roupa para chegar à pele para tirar a pele para rasgar a carne para chegar ao osso e aí entender que algo continua a escapar. Quero o que é fugidio e tremelicante. Ao leitor peço atenção e imaginação.

Escrevo como penso, e penso com contradições e hesitações. Talvez escreva para hesitar melhor. Sei que fujo da indiferença, faço exercícios arriscados nos textos e quero tentar dar forma a livros ambiciosos. Atraem-me lugares de estranheza e o contraste entre a maior precisão e a perda de nitidez, como quando abrimos os olhos debaixo de água, se o suportarmos. Procuro espaços para me desorientar melhor, fazer perguntas, peneirar as palavras para captar-lhes o que não é da ordem do verbal, um ritmo primeiro.

A praia que inspirou este livro é uma praia de excessos: de paixão, amor e de medo, revolta. Essa intensidade moldou o romance.

Tem sido uma travessia com muito afeto, é poderoso o amor pelos livros e a transformação que abrem. Este sábado há conversa sobre Faina na Praia da Tocha, Centro de Interpretação da Arte Xávega, 17h, com o leitor António José Cravo. apareçam para abraços-mergulhos!

da descoberta à conquista passando pelo achamento


(o beijo através do Atlântico, alegoria publicada na Revista da Semana do Brasil e na Ilustração Portuguesa celebrando a travessia Lisboa-Rio in Portugal século XX, Joaquim Vieira, Círculo de Leitores)

não haverá muito tempo um migrante indiano mostrava na televisão a sua filha a falar correctamente português, enquanto ele falava fundamentalmente inglês, fazia-o com o orgulho do pai que em portugal tinha encontrado uma nova vida e cuja filha estava perfeitamente integrada na escola, na língua, nesta terra que tinha escolhido.

a maior comunidade migrante em portugal é a brasileira, que tem sobre todas as outras a vantagem de falar português, embora seja o português do brasil, e por isso maior facilidade de integração. numa reunião literária a que assisti há pouco tempo, a palestrante, jornalista/escritora manifestou a sua preocupação com o facto de os filhos de migrantes brasileiros ao frequentarem a escola portuguesa, chegarem a casa e confrontarem os pais com esta “nova” forma falar português (sem gerúndios), o que poderia chocá-los.

ora bem, quer gostemos quer não, quer seja actualmente correcto ou incorrecto, é um facto, sempre, mesmo antes do regime de salazar, se falou das descobertas feitas pelos navegadores portugueses. agora considera-se que o termo correcto será “achamento”, porque não foram descobertas novas terras, porque já existiam. quem defende esta nova designação não são as populações indígenas – caso do brasil – mas os descendentes daqueles que foram “descobrir” novas oportunidades de vida nas terras “achadas”, ou seja, descendentes de descobridores reivindicam que em vez de “descoberta” se diga “achamento”. interessante não é?

mais, tendo escolhido portugal para fazer uma nova vida acham-se, alguns, no direito de exigir que nas nossas escolas/universidades aos seus filhos e aos que tendo vindo para cá concluir os seus estudos, seja ensinado o português do brasil. e assim de filhos de descobridores de terras por portugueses, segundo eles, achadas, querem-se conquistadores da terra dos achadores.

e nós, herdeiros da mentalidade salazarenta, subservientes e adoradores do que não é nosso mas do que de fora vem, preocupados estamos com tal situação.

eu que à minha maneira lutei contra o regime de salazar, que defendo as conquistas de abril, a liberdade, a igualdade, a fraternidade, e que defendo os migrantes e a sua integração na sociedade portuguesa, com direitos e deveres, em respeito mútuo; eu que me defino como homem de esquerda penso, às vezes por distracção, que este tema tem de ser clarificado pela esquerda portuguesa e não deixado em aberto, o que implica entregá-lo aos populismos de extrema direita.

politicamente incorrecto, do ponto de vista da esquerda, é “deixar andar” esta forma coxa de viver.

para o fausto (um repentismo)


porque não partiste

lembro um sonho lindo
uma viagem por um rio acima
a guerra e a rosalinda

a chula
o canto livre
a música a sociologia
a poesia

lembrarei sempre
um barco que vai de saída
uma cana verde a bailar
os trapeiros

o barco vai e vem
a viagem não pára nunca
tu és o capitão fausto
todo o porto é partida

volta breve quem nunca partiu

(figueira da foz; 01/07/2024)

Conversa com livros – António Cravo


no dia 2 de abril estive no Hospital de Sobral Cid, em Coimbra, a falar sobre livros.

não há palavras para descrever a conversa que tive com os presentes e o trabalho de Luís de Pessoa na elaboração do vídeo que vão ver.

obrigado a toda a comunidade do Sobral Cid pela oportunidade de partilhar pedaços da minha vida

josé santos silva ou “uma vitória do diabo”

josé santos silva ou “uma vitória do diabo”


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62 anos de idade, mais de 40 a trabalhar no museu santos rocha na figueira da foz, josé santos silva – o santos silva, como o tratam os amigos – é uma caixinha de surpresas e ele próprio um museu vivo.
com muitos e variados interesses e conhecimentos, “ajuntar” diabos é, há muitos anos, um dos seus interesses.
entre julho e novembro de 2019, está patente no museu santos rocha, na figueira da foz, um conjunto de mais 80 diabos nas mais variadas “encenações”.
a exposição leva o título “A [F]figueira tem o DIABO à beira”
homem de ideias, santos silva é um provocador dos diabos

 

25 de abril de 2017


um cravo para ti

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mais do que a palavra
somos o gesto

mais do que o pensar
somos o fazer

mais do que únicos
somos solidários

não somos diferentes
somos assim

temos a liberdade de o ser
por isso lutámos

temos a liberdade de te dizer
é teu o que conquistámos
mesmo que o não sintas
porque não viveste o antes

mais do que a mão que fere
somos a mão que dá

nessa mão um cravo
um cravo para ti
hoje que é 25 de abril
e tu sem o sentires
és a razão de termos feito

de continuarmos a ser
mais do que a palavra
o gesto

dentro dele o teu cravo

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(coimbra; 25 de abril de 2017)

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digo de mim


 

passa por mim o baixo mondego

passa por mim o baixo mondego

 

 

como somos breves

como é ilusório este corpo onde

pendurado o pensar

 

sento-me e vejo que tudo passa

num infinitésimo de tempo

passado presente e futuro estão

 

caio e levanto-me ainda

sorvo o instante como se o último

e grito como se nascesse

 

digo de mim

 

(da janela do comboio, algures entre coimbra e a figueira da foz

a carta


 

seguro

 

 

e escreveu-lhes uma carta

 

num tempo em que alguns se queixam de já não se escreverem cartas de amor, o tó-zé, pelo seguro, resolveu escrever uma carta, não de amor, mas de “esclarecimento”.

 

é jovem, provavelmente não pensa e … coisa mais grave, escreve o que não deveria sequer deixar que da boca lhe saísse.

 

dizer à troika o que se passa em portugal…. é ingénuo? pensa-nos tolos? faz deles parvos? ou …. nem sei.

 

mais, será que o jovem não sabe que as técnicas estão ao serviço de uma política? nunca lhe falaram nisso ou, mais uma vez, é uma farsa levada à cena neste palco de pobreza muita e variegada que se chama portugal?

 

não satisfeito com o envio da missiva em causa ao destinatário, entreteve-se a tirar cópias que enviou a quem de direito (ou de direita, conforme os casos).

 

de facto dá para pensar, como muitos portugueses, que seguro é o seguro de coelho.