dos nós
desfazer nós
é trabalho sujo
de mãos outras
ditas limpas
desfazer nós
é desfazermo-nos
criá-los é fazermo-nos
nas mãos do pescador
a arte de fazer e desfazer
os nós das cordas
mas essa é outra arte

(torreira; 2010)
dos nós
desfazer nós
é trabalho sujo
de mãos outras
ditas limpas
desfazer nós
é desfazermo-nos
criá-los é fazermo-nos
nas mãos do pescador
a arte de fazer e desfazer
os nós das cordas
mas essa é outra arte

(torreira; 2010)
cacilda
escrevo devagar
o teu nome
em cada letra
bebo o mar
cacilda és uma gamelas
filha do ti chico
irmã do cipriano
cacilda
sal escamas cordas redes
norte areia
por vezes peixe
cacilda
o sorriso as palavras
poucas o corpo entregue
à faina
cacilda
és MULHER
do mar

(torreira; 2013)
não creio
não creio em deus
e isso traz-me uma
felicidade diversa
como não existe
não me trará
qualquer problema
menos um
com que me
preocupar

(torreira; 2012)
vive
tudo é efémero
e belo
o momento existe
e tu
vive

(costa de lavos; 2017)
é pêxe
onde há mar
há pescadores
aprendo com eles
as artes
mais que os rostos
as palavras
tudo é novo
e tão antigo
não há geografia
que nos separe
quando é o mar
que nos junta
é pêxe o abraço

(alvor; empatar anzóis; 2018)
redeiros
arte minuciosa essa
como se de aranha
labor de mãos sábias
recolho nelas
o terem sido antes de mim
muito antes
as mãos dos meus maiores
mãos duras e simples
de trabalho
mãos transparentes
e límpidas
mãos que faço minhas
com orgulho
de ser deles mais um
não escrever eu
como eles rede faziam
é o que me dói

(torreira; 2015)
contigo
estendo-te a mão
para que te ergas
não para me afundar
contigo

(torreira; aparelhar das mangas 2016)
ouço-te cacilda
indizível o silêncio
verbalizá-lo é negá-lo
escrevo silêncio
silenciosamente
ouço-te cacilda

mulher do mar da torreira, a cacilda
(torreira; 2016; carregar o saco)
judas intemporal
judas era um bom homem
tão bom
que traiu o amigo e o vendeu
na versão canónica suicidou-se
numa nova leitura com o prémio
comprou terras para cultivo
a segunda versão parece-me
mais razoável
mais do nosso tempo aqui
intemporal

(torreira; 2010)
vidas com escamas
quantas safras
em quantos sacos
estas mãos
vidas com escamas
isso te digo
destes homens
destas mãos

(torreira; 2015)