o vómito


também nos comboios

 

escrevam em todas
as paredes
em todos os muros
das cidades
e das aldeias mais perdidas
no fundo das serras

escrevam em todos
as folhas de papel
seja ele qual for
soltas ou em caderno
brancas, de cores ou mesmo
sujas

mas escrevam
escrevam tudo o que
ainda não disseram
o que eles ainda não
ouviram

as palavras com pedras
com gente, com fome
com injustiça, com desespero

as palavras que virem
nos rostos cansados
consumidos e cerrados
no cansaço deste estar aqui assim

escrevam
foi para isso que aprenderam
o que os outros não
se não o fizerem
de nada servirá o que sabem

não
isto não é um poema
não sei sequer o que é isso
é um vómito
sobre esta corja toda
e eu quero vomitar hoje
nos palácios
nas mansões
nas administrações
nas governações

escrevam
escrevam muito
que nunca é tudo

quando o mar trabalha na torreira


ti tiago branco (falecido)

vem mar
traz contigo
as marés as ondas

venham as gaivotas
na areia medrosas de tanta fúria
e deixem
pegadas que o vento apagará

juntos
caminharemos ao encontro
do amanhã

lá onde eu não estarei
falarão de mim
os murmúrios do vento
o rebentar das ondas

e
quem sabe
talvez os homens

o espanto


espectacão

ao espectáculo da azáfama da xávega: homens, mulheres, máquinas, redes, cordas, barco, tractores, movimento, sons e vozes, nada nem ninguém fica indiferente.

até um cão, pára para olhar.

será que é preciso mais para que aqueles que deveriam ajudar na preservação desta arte centenária, atentem na necessidade de a apoiar para além do que até agora têm feito? (nada….)

até um cão, senhores, até um cão não fica indiferente à xávega.

(torreira, 2006)