eu


 

 

mais um andar ou o resto do aparelho da solheira prestes a ser colhido

mais um andar, ou o resto do aparelho da solheira, prestes a ser colhido

entre os poetas
que se dão ao trabalho de ler
palavras minhas
penduradas em imagens
sou
um fotógrafo

ao contrário
entre os fotógrafos
que distraidamente
soletram os poemas
que às imagens junto
sou
um poeta

falar de mim é por isso
escrever em imagens
registar com palavras
sempre o outro
o que não é

passo por entre
e fico em mim
a ser eu

sorrindo
(lentamente a rede vai sendo colhida pelo joão costeira, e eu fico assim pendurado do que sou, a boiar nas águas da ria)

fazer pelo hoje


 

 

como era duro

como era duro

 

 

foi-se o tempo
regressam os dias
a isso chamam
recriar

recreiam-se alguns
com o recriar
na contemplação
do como era
tudo sobrevoam
sem poisar no ter sido

não
não era assim
era

vêm de longe
ver o que nunca viram
e vão sem terem visto
porque nunca nada é
o que foi quando foi

é tempo de recuperar a memória
de recriar
seja este o tempo de
preservar o presente
para que não seja ele também
passado já

os que da xávega vivem
dir-vos-iam isto
se fossem mais que pescadores

 

(torreira; recriação da xávega com bois, setembro 2013)