fecho os olhos

fecho os olhos
para te ver
reinvento o corpo
desde a raiz o percorro
algures os lábios
eu sei
tão longe
(torreira; 2015)
fecho os olhos

fecho os olhos
para te ver
reinvento o corpo
desde a raiz o percorro
algures os lábios
eu sei
tão longe
(torreira; 2015)
nós

não há geografia
que mate os afectos
impossível desatar
nós ancestrais
entrego-me nas mãos
do tempo e sou
(torreira; 2010)
desafio

todo o desenho
não é mais
que um esboço
quase perfeito
inventar o esboço
é o desafio
mais que perfeito
(costa de lavos; 2017)
quando o mar trabalha

depois de seco o saco é de novo fechado para o aparelho da xávega poder fazer novo lanço. ao acto de fechar o saco chama-se “dar o porfio”, é o que está a fazer o meu amigo agostinho canhoto
é de rede
deitada ao mar do tempo
este livro
em terra
ficará a contar estórias
a falar de muitas vidas
e saberes
fora dele muito mais
que para tudo
saco não havia
e peixe houve que saltou
deu-se o porfio
fechou-se o saco
é na praia que encontras
os búzios que procuraste
em casa
(torreira; 2011)
bem vindo à sua terra
bem vindo à sua terra
dizem-me quando
não sei desfazer este nó
prendem barcos
unem cordas
ligam gente
são raízes
os nós
mas como são frágeis
os nós humanos
como somos
sem nós
há nós impossíveis
de desfazer
pois há

(torreira; 2010)
o amor
eis a mão habitada
casa do homem
aberta porta
eis a mão do homem
onde o mundo
línguas várias
eis o homem na mão
inteiro de ser nela
sem máscara
eis o homem-mão
irmão de todos
eis nos olhos
o amor

(lousã; 30_05_2018; 85 anos, tio joão)
órfãos vão os dias
estou onde
os olhos me levam
semeio letras
enleadas nas redes
de outras mãos
tudo é memória
invento
o haver amanhã
órfãos vão os dias

(ribeira de pardelhas; 2009)

falam as mãos?
sabes ouvi-las?
as tuas mãos
como as usas?
dás a mão a quem?
quem te deu a mão?
dançam as mãos?
quantos dedos te arrancaram
quando deste a mão?
as mãos são
não sei se tu és
(coimbra; 2013)
a vida é um jogo de mãos
essencial
essencial a corda
as mãos
tu nelas inteiro
essenciais as mãos
a corda
tu nelas sempre
essencial tu
fazedor de

(costa de lavos; 2017)
oiço-te
escuto nas mãos
as vozes por dentro
oiço-te

(torreira; 2013)