o reflexo de ti


nocturno na ria
 
procura a
a beleza
essa que te recusas a
existe
onde tu
 
nada é
tudo pode ser
em ti a escolha
o querer
 
há luz
por dentro do silêncio
da noite
é a mais pura
a mais bela
a mais tua
 
não digas que não
sem saberes se
sem te procurares
o reflexo de ti
és tu ainda
 
saberás vê-lo?
 
(torreira; marina dos pescadores)
 
 

quando o mar trabalha na torreira_massa


massa
 

além onde
as cores se confundem
mar e céu se unem
mora o meu sonho
o meu desejo

um barco parte
nele somos mais que nós
levamos connosco
raça que herdámos
de um tempo
antes do tempo

sobre o mar caminhamos
sem medos de vagas
correntes ventos
de onde viemos
para onde vamos
é um caminho que fazemos
de espuma a ferver

além
para além ainda
da linha do horizonte
morarei sempre
onde o sol nascer

(torreira, século XX)

 

serem aqui gente


as mulheres-meninas da torreira

 

mulheres-crianças-meninas

ao peso das redes e das cordas

crescem na areia

beijando o mar

 

sabem das férias

o sabor a sal

a escamas no rosto

o corpo inteiro é

 

resistem

que mais se lhes não pede

não as chamam

vêm

não lhes pedem

fazem

 

crianças-meninas-mulheres

sorriem brincam são mais

no serem aqui

gente

 

(torreira; companha do murta)

A criação da Associação dos pescadores Avieiros


Foi criada a Associação para a Promoção da Cultura Avieira, abreviadamente designada por APCA, ou Associação dos Avieiros.

Este é mais um passo importante para a afirmação das comunidades Avieiras e uma forma de demonstrar que o projecto de candidatura da cultura Avieira a património nacional só faz sentido se conseguir em primeiro lugar contribuir para a melhoria das condições de vida e de afirmação das comunidades ribeirinhas.

De acordo com o documento que segue em anexo, produzido pela APCA para ser distribuído pela imprensa e pelas comunidades, pretendem os Avieiros ter uma voz e um papel ativos no apoio e na dinamização de ações que visem defender os interesses da sua comunidade, como também contribuir para a elevação da cultura Avieira a património nacional.

É nosso dever informar sobre a nova Associação e sobre a importância da sua constituição e é o que fazemos com a criação desta Folha Informativa.

Pela primeira vez uma Folha Informativa aparece com o número oficial do ISSN, o que significa que este instrumento de comunicação que o projecto criou, passa a estar disponível na Biblioteca Nacional de Portugal, atingindo uma dimensão institucional de âmbito nacional.

Ao IADE e ao nosso amigo Prof. Carlos Barbosa, ele próprio também perfilhado pelos Avieiros, agradecemos a preciosa colaboração para a criação do logótipo da APCA.

 O Gabinete de Coordenação

(Projecto de candidatura da cultura Avieira a património nacional imaterial e da Unesco)

 

FOLHA Nº08-2012_A Associação dos pescadores Avieiros

quando o mar trabalha na torreira_maria brandão


maria brandão

nestes dias de sal
a queimar a pele
seca
sou mais que eu
sou “a mulher”

na areia quente
da praia
camarada da companha
sou
nas fainas de terra
ombreio com todos
por igual

mas

serei mais mulher ainda
quando o sol se puser
e vieres ter comigo
falando com voz de pão
sopa um copo
o corpo

 

(torreira, século XX)

sorri para ti


a porta

abre a porta

todas as portas fechadas

esperam por ti

o braço inicia o movimento de

a mão

 

onde antes silêncio sombra

pesos insuportáveis

súbito se transmutam

a porta abriu-se

tu

 

deixa os pés irem

pela casa caminhas

descobres

teia a teia desfazes

a arte das aranhas dobrada

ao peso do pó e do tempo

 

abre a porta

sorri para ti

(s. pedro do sul; serra da gralheira; covas do monte)

quando o mar trabalha na torreira_armando bastos (palito)


armando bastos (palito)

 

o mar sorri-me em segredo
só eu entendo a sua linguagem
feita de ondas e espuma

conversas longas
temos
as mãos dão-se húmidas
onde sal sela
amizades

areia
onde nossos corpos
encontram descanso

os pés rompem a toalha
poisam na areia
para levantar voo
encontrar outro chão
de madeira feito

parto
ao teu encontro

no silêncio das ondas
são mais límpidas as cores

os nossos olhares cruzam-se
dizem-se coisas
falam de amores

 (torreira; século XX)