os moliceiros têm vela (465)


entre 2010 e 2021 foram muitos os moliceiros que desapareceram. os que de novo foram feitos não os superam.

não vou citar nomes de homens e barcos, mas seja o ti abílio, amigo do peito, mestre das artes do mar e da navegação – que já não tem moliceiro e por isso não estará presente na regata de hoje -, o símbolo do amor a estas aves tão belas a que deram, por arte e ofício, o nome de moliceiros

torreira; regata do são; 2010

postais da ria (394)

postais da ria (394)


eternidade breve

o assassínio do futuro
condena-me a conjugar
os verbos no passado
se os nomeio

folhas secas juncam o chão dos dias
inscrevem nomes na memória
povoam o silêncio

estar vivo é saber
da morte dos outros
ser a sua eternidade breve

outra não há

torreira; regata bateiras à vela; são paio; 2013

postais da ria (389)

postais da ria (389)


caminho andado

torreira; regata de bateiras à vela; s. paio; 2013
caminho descalço
pelos dias de estar aqui
olhos abertos como mãos
em tempo de fruta madura

caminho descalço
dorido de tantos cacos
pedras vidros pregos

recuso o conforto da cegueira
auto imposta felicidade
falsa de luas inventadas

doem-me os olhos de ser 
torreira; regata de bateiras à vela; s. paio; 2013

postais da ria (387)


eu ainda

o ti zé formigo ainda está aqui comigo – (regata do emigrante; cais do bico; 2018)
tenho o passado 
num disco externo

chego devagar
lento é o tempo de

revejo amigos
idos para sempre

fui por inteiro
não me resguardei

se traidores houve
só um é culpado
eu por ter acreditado

postais da ria (365)


o silêncio é uma vela

torreira; regata do s. paio; 2020
começas a escrever os dias
a repetir a palavra ontem
cada dia mais vazia de vida
mais cheia de memória


em ti habitam os que partiram
em ti se demoram
no sobrevoar da ria tão deles


olhas como te ensinaram
e lembras os nomes os rostos
ainda ouves as vozes


o silêncio é um barco
e tu a vela que o tempo enche