as coisas elementares


indiferença de ser rio

 

falo das coisas mais
elementares

o sino da igreja
onde um galo não canta
um seixo rolado
guardando o tempo
dentro de si
um torrão de terra
grávido de uma semente

mais elementares ainda

os sorrisos presos nos lábios
das crianças tristes
as lágrimas
rios de salgados
nos leitos dos rostos abandonados
nos lares/depósitos

falo porque
estou cansado de comer silêncio
e ler poemas de amor
com tanto desamor
a caminhar por aí

as coisas mais elementares
são as que deviam ocupar
o ventre das palavras por parir

murmúrios


sobre a areia tábuas, nada mais que

de onde me vêm

estas vozes?

estes murmúrios?

 

trazidos pelo vento

caem sobre mim

como folhas de outono

também nós caímos

 

cairemos um dia

desfeitos em pó

palavras noutros

que o tempo levará também

 

o inverno

aproxima-se

sorrateiro abraça-me

 

deixa-me pendurado

de um beijo que não vem