os moliceiros têm vela (231)


do tamanho

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(relendo fernando pessoa
«Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura.»)

olho à minha volta e vejo
que nesta terra
os que nela mandam
não têm sequer
o tamanho da altura que têm

como poderão ver?

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(murtosa; regata do bico; 2013)

construção de um moliceiro (1)


9 de agosto

depois de ter passado 3 a 6 meses mergulhado na água salgada da ria, foi dada ao bordo a forma definitiva, de acordo com o molde do mestre, e aplicado ao costado.

hoje foi o bordo de estibordo.

na hora da aplicação parece que os amigos se multiplicaram e foram muitos os que apareceram para ajudar.

do nuno setenove ao ti alfredo, nos extremos do registo, houve gente da terra, de fora, emigrantes ou simples curiosos, que deram a mão.

a celebração do moliceiro, enquanto objecto de solidariedade e de amor pela terra, começa na sua construção.

(torreira; 9 de agosto de 2016)

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8 de agosto

depois de marcado no costado o posicionamento do bordo, de acordo com o molde de bordos, faz-se a aplicação do bordo.

pela dimensão, pela espessura, pelo afeiçoamento que é necessário fazer, é uma tarefa delicada e que, ao mesmo tempo, exige muita força e saber.

qualquer procedimentos menos adequado pode levar ao quebrar do bordo e a um prejuízo enorme.

antes de começar a aplicação do bordo, o mestre zé rito, parou por uns momentos e disse:

” como dizia o mestre henrique lavoura, antes de aplicar um bordo é preciso descansar um bocado”.

QUER É CALMA

todos os presentes ajudaram, até um turista francês que começou por fotografar, acabou por dar a sua mão – é o segundo na fila a contar da direita.

(torreira, 8 de agosto de 2016)

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6 de agosto
depois de feitas as marcações na tábua do casco, o mestre zé rito aplica sobre ela o molde dos “bordos”, seguindo a parte superior do molde é feita a marcação do bordo.

em seguida é feito o corte da tábua para aplicação dos bordos.

(torreira; 6 de agosto de 2016)

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5 de agosto

o folhear da proa

hoje para além do começar da “coxia”, continuou-se o folheamento do costado.

neste registo vemos o mestre zé rito a fixar a tábua de costado, apertada pelos grampos e pressionada por mãos amigas: havia-as da torreira, de estarreja … de amigos.

a construção de um moliceiro é uma celebração.

(torreira; 5 de agosto de 2016)

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3 de agosto (cont.)

apertando os grampos, o mestre zé rito força o arqueamento das tábuas que formam os costados do barco – é o folheamento de que já falei.

por cima desta serão colocados os “bordos”.

(torreira; 3 de agosto de 2016)

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os moliceiros têm vela (228)


ao meu funeral
(que não vai haver)

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o “Doroteia Verónica”

irão

alguns
para se despedirem

outros
por ser conveniente

muitos
para confirmarem que

o preto é uma cor
sempre na moda
emagrece e fica bem

e depois
roupa preta
quem a não tem?

EU!

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mais um moliceiro que teve de ser vendido e anda amputado pelos canais de aveiro

(murtosa; regata do bico; 2009)

postais da ria (182)


da amargura

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o manuel fonseca (manuel tala) a cirandar berbigão

quando o conhecido
se torna desconhecido
é tempo de ser outro

os navios partem
sem saber de regresso
semeando o mar
de saudades amargas

fecham-se portas
outrora escancaradas
e não há janelas
por onde luz venha

é tempo de ser outro

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o colorido dos dias é agora outro

(torreira; julho; 2016)