
“ugalho de rer”
o sal do atlântico
o artesanal
onde a flor
é cristal

a mulher e o sal
(morraceira; 2016)

“ugalho de rer”
o sal do atlântico
o artesanal
onde a flor
é cristal

a mulher e o sal
(morraceira; 2016)
fui-me

cirandar
anoiteci-me aqui
é tarde meu amigo
é tarde
fui-me

cirandar
(torreira; 2016)

eis as mãos
eis a faina o labor
de haver mar

(torreira; 2016)
o fotógrafo e o moliceiro

há momentos que dificilmente se repetirão, este é um deles.
éramos 3 dentro do moliceiro, dentro da regata, no meio da ria – eu, o carlos lopes franco e o ti abílio.
o ti abílio tripulava o barco, eu e o carlos, tentávamos captar as imagens possíveis.
foi de loucos. a acção ultrapassava tudo, até um hipotético enjoo do carlos (olha que eu enjoo – tinha-me dito).
não houve tempo para mais nada senão viver o instante.
junto do traste, depois de ter feito o filme possível, que ainda espera edição, fotografava como sabia e o que podia.
neste registo o carlos fotografa o ti abílio – esquecido de tudo o resto -, o ti abílio governa o moliceiro – não pensa em mais nada – e eu fixo o momento.

(torreira; regata do s. paio; 2016)

diz-se: rer

(morraceira; figueira da foz; 2016)
(existe uma marca registada “Beleza do Sal”, que nada tem a ver com a designação dada a esta série de fotos)
decisão

o que vêem os olhos de um pescador
disseram-lhe
corta o mal pela raiz
não hesitou
logo ali cortou os pés

por onde andará o peixe?
(torreira; 2012)
com o meu amigo salvador belo, de partida para largar a solheira
bem hajas antónio brandão

nuno cunha e o mestre zé rito fixam a bica do moliceiro
há datas que não são para esquecer, esta é uma delas.
o nuno cunha (setenove) e o mestre zé rito, fixavam a bica da proa do moliceiro. a construção progredia.
eram muitos, como hábito, os que assistiam àquilo a que chamei “celebração da ria”, entre eles alguns dos irmãos “brandão”.
o antónio brandão veio, de repente, ter comigo e disse-me:
– sr. cravo, tenho lá em casa uma caixa que a drª andreia me deu, com desenhos de moliceiros, e que lhe deve interessar.
pegou na bicicleta e, pouco tempo depois, trazia na mão uma caixa branca, de arquivo, que me deu para as mãos.
abri e vi que era a tese de licenciatura, de 1999, da minha amiga andreia leite, falecida aos falecida em 2008, aos 31 anos, de leucemia, e que muito me ajudou nas pesquisas sobre o naufrágio do nathalie. o documento tinha dado origem à tese de mestrado que viria a defender na universidade portucalense.
fiquei sem palavras e só fui capaz de dizer ao antónio:
– guarda-o é uma oferta que deve permanecer na família.
– sr. cravo, dou-lho como se o desse ao meu pai.
os olhos falaram pelos dois, não fui capaz de dizer que não e limitei-me às palavras mais simples:
– nunca me hei-de esquecer deste dia, antónio.
– e eu nunca me hei-de esquecer de si, sr. cravo.
escrevo o que se passou e volto a sentir tudo……..
a memória aqui fica e o testemunho de uma amizade que junta várias.
a construção do moliceiro proporcionou-me um dos momentos mais sentidos em toda a minha passagem pela torreira.
bem hajas antónio brandão
(torreira; 2 de agosto de 2016)
recuso ser de férias

o carregar da rede na zorra
é tempo de olhar
de sentir tudo
o regresso cada dia mais
improvável
é também ele nebuloso
fui
no tempo que passou
espectador atento e preocupado
recuso ser de férias
sou
a impossibilidade de ser mais
sendo menos
fica a memória a pairar na praia
longe

veio do mar, irá agora ser entendido e secar
(torreira; companha do marco; 2016)
para o ti abílio carteirista

a beleza da ria no corpo de um homem
já nem palavras tenho
ti abílio
o que lhe ofereço são
migalhas de mim
migalhas que guardo
apenas para os amigos

esplendor aos 80 anos
(torreira; regata do s. paio; 2016)

praia da claridade com a “boa viagem” ao fundo
procuro
apartamento para arrendar
figueira da foz
tenho muitos livros
imobiliárias amigos
pequenos anúncios
a eterna internet
motores de busca
buscam
apercebo-me de que só posso
aceder à gama média baixa
aposentado com
um metro e sessenta e cinco
a que podia aspirar?

eu vou conseguir